Da realidade para o cinema, e do cinema para a realidade. Pode até a parecer coincidência, mas realmente aconteceu e acontece. Logo após o filme do diretor José Padilha ter esgotado as bilheterias de todo Brasil com os sucessos Tropa de Elite I/ Tropa de Elite II, a guerra civil que sempre esteve presente nas últimas décadas do Rio de Janeiro, alcança um novo estágio. Bastou o confronto entre o aparelho repressivo do Estado e o tráfico de drogas ultrapassar um pouco as fronteiras do território de guerrilha, que o resultado veio de imediato: as pessoas que antes nao presenciavam a guerra em sua realidade, agora se sentem presenciando a partir de uma ótica assentada nas representações construídas pelo filmes do Tropa de Elite.
O espetáculo que inverte o real é produzido de forma que a realidade vivida acaba materialmente invadida pela contemplação do espetáculo, refazendo em si mesma a ordem espetacular
Outrossim, as grandes mídias tradicionais ( televisão, rádio e impresso), também colaboram para a espetacularização da guerra. Entretanto, elas cumprem um papel diferente uma vez que se responsabilizam por uma cobertura jornalística diária da realidade. Dessa maneira, o produto jornalístico não se afirma explicitamente para a população como um produto de espetáculo, embora o seu conteúdo possua esse viés. De fato, a mídia tradicional atua como um dos mais importantes equipamentos sociais das sociedades de controle, na medida em que produz e fortalece subjetividades que formam e orientam nossos valores, opiniões e conceitos a partir de um formato que nos cria a idéia de verdade. Afinal, se for adequadamente analisada, é claramente perceptível a valorização do excepcional e do dramático, o que acaba se tornando uma ferramenta de persuasão fundamental no discurso de uma reportagem, por mais que ela se fantasie de imparcialidade.
O espetáculo não é um conjunto de imagens, mas uma relação social entre pessoas, mediatizada por imagens.
Voltando ao fenômeno “Tropa de elite”, é importante observar uma divergência do segundo filme em relação ao primeiro. Aliás, o filme Tropa de Elite II acaba se tornando uma espécie de antítese em relação ao Tropa de Elite I, o que de certa forma provoca conseqüências bastante interessantes. Bem veja , quando o primeiro filme dialoga com a guerra civil a partir da perspectiva de um comandante do Bope ( construção heróica de um anti herói, Capitão Nascimento), ele acaba desenvolvendo seu discurso sob um percepção maniqueísta. Existem basicamente as seguintes representações: O policial do bem x o (sistema) policial corrupto, o policial do bem x viciado e o policial do bem x o traficante.
Isso tudo fica bem posto em uma narrativa focada na ilustração do lado humano e emocional do Capitão nascimento. Por outro lado, o Tropa de Elite II dialoga de uma maneira completamente inversa, embora a narrativa continue centrada no anti herói Capitão Nascimento. Entretanto, agora o próprio personagem vai desconstruir sua percepção maniqueísta, problematizando a guerra civil de um ponto de vista estrutural e não mais gerencial. Alem disso, o segundo filme também utiliza de personagens coadjuvantes que desempenham o papel de contra-argumentar o anti herói, pontuando questões societárias como os direitos humanos.
Entendido essa divergência entre os dois filmes, fica mais fácil de observar suas conseqüências, que se evidenciam cada vez mais nas redes sociais Facebook e Twitter. Assim, durante os últimos acontecimentos dessa guerra, as pessoas manifestavam em suas redes( shows do eu) seus posicionamentos, reproduzindo argumentos e falas apresentadas nos filmes de José Padilha. É como se o espetáculo tivesse se naturalizando nas opiniões, fazendo um mapeamento ideológico das pessoas a partir das representações construídas nos dois filmes: as que pensam como o Tropa de elite I x as que pensam como o Tropa de Elite II . De maneira quase sem querer, inventou-se o Tropa de Elite III.
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